20 January 2008

estou num dia...

em que me pesa, como uma entrada no cárcere, a monotonia de tudo. A monotonia de tudo não é, porém, senão a monotonia de mim. Cada rosto, ainda que seja o de quem vimos ontem, é outro hoje, pois que hoje não é ontem. Cada dia é o dia que é, e nunca houve outro igual no mundo. Só em nossa alma está a identidade – a identidade sentida, embora falsa, consigo mesma – pela qual tudo se assemelha e se simplifica. O mundo é coisas destacadas e arestas diferentes; mas, se somos míopes, é uma névoa insuficiente e contínua. O meu desejo é fugir. Fugir ao que conheço, fugir ao que é meu, fugir ao que amo. Desejo partir – não para as Índias impossíveis, ou para as grandes ilhas ao Sul de tudo, mas para o lugar qualquer – aldeia ou ermo – que tenha em si o não ser este lugar. Quero não ver mais estes rostos, estes hábitos e estes dias. Quero repousar, alheio, do meu fingimento orgânico. Quero sentir o sono chegar como vida, e não como repouso. Uma cabana à beira-mar, uma caverna, até, no socalco rugoso de uma serra, me pode dar isto. Infelizmente, só a minha vontade mo não pode dar.

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